segunda-feira, 16 de maio de 2011

Ele lá e nóis cá

Há exatamente uma semana atrás, João embarcou em sua primeira missão para o Japão.
Desde então, estou sozinha em casa com as crianças. 24h. E será assim até o fim do mês de junho.

Como estamos? Acho que bem. Agora as zicas começaram a dar trégua. Na semana passada, todos (sem exceção) ficaram doentes. E hoje de manhã, finalmente, descobrimos o que Nina tinha e a fez chorar durante o fim de semana inteiro. Córnea machucada, provavelmente por conta de coceira no olho durante a gripe. Mas agora estou tranquila porque sabemos o que é e ela está medicada e mais calma.

Gabriel e Iuri também estiveram gripados (sim, até o pequenininho!), mas estão todos melhores agora.

Sinto que a imunidade geral da casa deu uma baixada com a viagem do papai para tão longe e por tanto tempo... Mas eu não fico pensando no tempo nem na distância. Tenho vivido um dia de cada vez, me concentrando no que devo fazer naquele dia e vou fazendo e o dia vai passando. Nos momentos em que estive mais cansada, nem cheguei a pensar 'puxa, mas se o João estivesse aqui seria diferente'... Bom, ele não está e não adianta, nem ajuda nada pensar assim.

Ele está feliz, ainda se adaptando ao fuso maluco. Enquanto ponho as crianças para dormir, ele está se arrumando para ir para o trabalho. São doze horas certinhas de diferença. É bem doido pensar por exemplo no que ele está fazendo, vendo agora... tudo tão diferente! Uma ilha mega-desenvolvida, auto-suficiente, super populosa, linda e interessante. É o caos organizado, como ele gosta de falar. Pessoas disciplinadas, que comem tudo o que está em seus pratos, categóricas, simpáticas e amáveis. Enfim, não sou eu quem estou lá, mas João é um ótimo observador, relator, 'descrevedor'... para mim, um escritor!

Ele me perguntou hoje se sinto saudades dele. Sim, sinto. Mas não quero ficar na melancolia. Até porque na maluquice do nosso mundo atual, ele 'janta' com a gente em cima da mesa, enquanto nos falamos e nos vemos no skype! Trocamos emails diários. Ele posta vídeos no facebook e assim vamos nos mantendo informados, interligados e conectados. Literalmente, eu sou a mulher que 'fica em casa', enquanto ele, homem, corre o mundo e traz notícias de lá para cá, de fora para dentro!

Estes são dias especiais onde percebo que, mesmo na ausência, ele está presente diariamente em nossas vidas. Nas conversas, nas brincadeiras, nos choros, nos sonhos. Ele está fora, mas sua essência, seus valores estão aqui dentro. E nós estamos aqui, mas estamos com ele o tempo todo. Sei que ele nos leva para passear em todos os lugares legais que ele vai...

Aprecio também a sua disposição para ficar solitário. Sou grata pelos momentos que tenho comigo mesma e pelos momentos que ele está consigo. Não tem preço! Um dia de cada vez. Vivendo este momento único como deve ser. Separados, mas muito unidos.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Manifesto pela amamentação - texto de Lia Miranda

Queridos leitores e leitoras, compartilho com vocês estas sábias e belas palavras sobre amamentação. Assino embaixo. Vale a pena!

Manifesto pela amamentação

Manifesto pelo direito das mães de não serem separadas de seus filhos logo após o seu nascimento e de permanecerem com eles o tempo todo pelo menos durante a primeira hora após o parto. Um recém-nascido não deve ser afastado de sua mãe, a não ser em períodos muito breves, em caso de extrema necessidade, e não deve ser deixado em berçários.

Manifesto pelo repúdio à alimentação artificial em maternidades, sem indicação clínica, quando a criança está apta a mamar e a mãe, disponível para amamentar. Água glicosada ou qualquer outro recurso que prejudique o reflexo de sucção do bebê são inaceitáveis.

Manifesto pelo direito das mães com dificuldades para amamentar de receberem apoio e orientação adequados por parte dos profissionais de saúde e da família. Mães com dificuldades de amamentação precisam de encorajamento e solidariedade.

Manifesto pelo direito das mães de amamentarem em livre demanda, sem serem desencorajadas por profissionais de saúde ou parentes sob o argumento de que os bebês têm de ter hora para mamar. Os bebês têm direito ao seio sempre que necessitarem, de dia ou de noite.

Manifesto pelo direito das lactantes de não serem pressionadas por parentes, profissionais de saúde, amigos ou conhecidos a oferecerem mamadeiras e chupetas. As mães são as principais responsáveis pelos cuidados com os seus filhos e devem ter o direito de alimentá-los de forma natural e instintiva.

Manifesto pela urgência de os pediatras serem profissionais e éticos ao interpretarem as curvas de crescimento, sem indicar alimentação complementar precoce a um bebê saudável simplesmente porque ele não se encaixa no padrão médio. Cabe aos médicos avaliarem se alterações nos padrões de engorda ou de crescimento são patológicos ou fisiológicos.

Manifesto pelo direito de uma mãe de manter o aleitamento exclusivo durante os seis primeiros meses de vida de seu bebê, sem ser assediada por parentes, profissionais de saúde, amigos ou conhecidos para que ofereça outros alimentos sem necessidade.

Manifesto pelo direito das mães que trabalham fora de casa de terem em seu ambiente de trabalho um local adequado, com higiene e condições de armazenamento do leite, para fazer a ordenha, seja para alívio das mamas, para a estocagem de leite a ser oferecido a seu filho na sua ausência ou para doação aos bancos de leite. As empresas devem oferecer condições para que suas funcionárias mantenham o aleitamento após seu retorno ao trabalho, seja flexibilizando seus horários, mantendo creches em seus recintos, instalando salas de ordenha ou permitindo que a criança seja trazida à mãe para receber o seio.

Manifesto pelo direito de toda mulher que trabalha fora de casa a gozar de uma licença maternidade de seis meses. Seu retorno ao trabalho também deveria ser facilitado, com possibilidade de redução de jornada com o recebimento proporcional do pagamento ou flexibilização de horários.

Manifesto pelo direito dos bebês de serem amamentados enquanto necessitarem, mesmo que esse tempo supere o período considerado aceitável pela nossa sociedade.

Manifesto pelo direito de as mães amamentarem seus filhos em público, quando necessário, sem serem condenadas por pudores hipócritas.

Manifesto pelo direito de as mães amamentarem durante a gestação, ou amamentarem mais de uma criança simultaneamente, sem serem ameaçadas com dados inverídicos acerca de efeitos nocivos para a criança que mama ou para o feto.

Manifesto pelo direito de as mães amamentarem livremente, e de os bebês mamarem livremente, sem serem alvo de preconceito ou ignorância.

Lia Miranda

domingo, 1 de maio de 2011

Uma aventura no mato - de como me perdi e me encontreii

NO domingo passado, há uma semana atrás, tive uma experiência espiritual.

Estávamos fazendo um "retiro" familiar e fomos passar o feriado da Páscoa em um Hotel Fazenda próximo à Formosa. O local nos era estranho, mas como algumas pessoas que conhecemos já haviam estado lá (inclusive Nina em duas ocasiões), decidimos ir. Chegamos quarta de noite. Dormimos e foi tudo tranquilo.

No dia seguinte, Gabriel deu tanto trabalho com choros e pedidos de voltar para casa e juntamente com o estilo do lugar (música "ambiente" alta, música e atividades na piscina) no feriado, quase voltamos para casa mesmo. Mas já que já estávamos lá, decidimos ficar. E, apesar de definitivamente não ser o nosso ambiente, aproveitamos ao máximo o que tínhamos para fazer: andar a cavalo, ir à piscina, passear de charrete, olhar as estrelas, tirar leite da vaca... Nina se divertiu horrores todos os dias, fez amigos e não queria ir embora... Gabriel acabou se convencendo que ficaríamos lá alguns dias e também aproveitou.

Enfim, no último dia, foi oferecido um passeio a uma gruta. Todos os dias eles propunham algum passeio pela manhã e João e Nina foram a alguns. Fiquei com vontade de ir naquele dia. Sairíamos cada um no seu carro às 9h30 e deveríamos estar de volta às 11h30, conforme a informação que recebemos. Muito bem, João concordou. Deixei Iuri mamado e parti com os outros.

Então começaram os problemas, demoramos meia hora de carro, entrando e saindo de porteira, para chegar a uma fazenda. De lá, andamos mais uns 20 minutos a pé até outra fazenda, onde pagamos 5 reais e pegamos uma trilha. Na verdade, havia um muro de pedra bem longo, construído por escravos, que devia ter no mínimo uns duzentos anos. Ao longo deste muro, havia uma subida longa e íngreme, também de pedra. Antes de subir, tive um pressentimento e olhando para o relógio, percebi que praticamente metade do meu tempo já havia se esgotado. Disse que iria embora sozinha dali. Mas alguns colegas me encorajaram a ficar e fiquei.

Subimos o caminho de pedra. Chegando lá em cima, era uma mata com trilhas fechadas. Demoramos mais uns 10 minutos até chegar no local. Era um paredão de pedra gigantesco, que mais parecia um penhasco. Para "entrar" na gruta, era preciso descer. Eu olhei lá pra baixo e me desanimei completamente. Naquele momento, minha preocupação de mãe falou muito alto e eu disse que iria voltar sozinha mesmo, pois tinha neném para amamentar e não poderia esperar mais. Avisei alguns e fui embora.

Em menos de dois minutos, como estava andando rápido, já havia perdido a trilha e estava perdida. Continuei no mesmo ritmo por uns 20 minutos, sem a menor chance de voltar. Gritava em vão. Não havia ninguém para me escutar. Na minha cabeça, eu deveria topar com o muro de pedra a qualquer momento, mas ele nunca chegava. Reparei que estava começando a ficar toda machucada, arranhada e assustada. Seguia alguns caminhozinhos que me pareciam trilhas, mas eles rapidamente sumiam de novo e comecei a ficar bem preocupada.

Não sabia o que fazer, não sabia onde estava. Comecei a falar em voz alta para o João ficar muito calmo e tranquilo, cuidar e alimentar as crianças, principalmente o Iuri. Imaginava alguma mãe do Hotel dando-lhe de mamar ou até mesmo uma mamadeira para acalmá-lo. Mas eu já estava há muito tempo perdida, minha água estava acabando e reparei como estava andando rápido demais, como uma louca, quase desesperada.

Então achei um clarão, um vão entre algumas árvores. Sem saber o que fazer, fiz xixi. Tentava parar, ficar quieta e meditar, mas não conseguia. Dei uma volta e reparei que havia voltado para o mesmo lugar. Foi nesse momento que desisti de tentar me encontrar. Entreguei os pontos, abri o jogo com o universo. Eu sabia que havia feito uma merda muito grande e não tinha como consertar. Não podia fazer nada, não sabia que caminho tomar.

Então tomei aquela situação como uma prova. Uma prova de fé e entrega. Já que eu já havia errado mesmo e não tinha opção, a não ser me desesperar, decidi me acalmar e entregar ao universo o meu destino ali. Comecei a andar mais lentamente, tomando cuidado para não me machucar tanto, nem torcer o pé, já que pisava em falso o tempo todo. Andei mais alguns minutos e aí eu vi uma cerca de arame farpado em um terreno em declive.

Me dirigi até ela e comecei a descer, sem perdê-la de vista. Depois de alguns minutos, a mata foi ficando menos espessa e pude ver do outro lado da cerca um riozinho e uma casinha ao fundo. Atravessei a cerca e fui descendo, rolando, no meio do mato alto. Chegando no riozinho, ouvi latidos de cachorro e comecei a gritar: "Socorro! Estou perdida! Prenda os cachorros por favor! Me ajude!" Então apareceu uma mulher muito calma perguntando o que estava acontecendo.

Ah, que felicidade! Eu estava salva! Com certeza dali, não demoraria muito para chegar até o meu carro! A mulher foi muito amável e me ensinou um caminhozinho que eu deveria tomar para chegar até lá. Andei bastante até chegar nas mangueiras que ela havia me falado. E aí, de novo: mais latidos de cães e eu gritei a mesma coisa. Veio um homem e eu o reconheci como sendo o homem a quem eu havia pago 5 reais para entrar no caminho de pedra. Expliquei novamente a situação. Ele disse que parte do meu grupo (com crianças) já havia descido e ido embora. Ah, como me senti tola! Se eu tivesse esperado um pouquinho no paredão, não teria feito o caminho de volta sozinha, nem teria me perdido! Mas enfim, não adiantava chorar por aquele leite derramado. O moço me garantiu que, seguindo um atalho que me mostrou, chegaria até o meu carro.

Eu protestei, dizendo que o caminho que eu havia feito para chegar lá havia sido outro, mas ele me encorajou e segui em frente. Depois de muito andar, cheguei a outra fazenda. Não havia carros, não era lá. Gritei e demorou muito até alguém vir me atender. Era uma mulher e ela estava assustada com minha gritaria. Ela tinha um celular que funcionava por antena. Pedi para ela ligar para o hotel , mas ela não tinha o número. Ligou para uma vizinha, que disse que um grupo de gente estaria me esperando na "segunda ponte". Ela me disse que me levaria até lá.

Não encontramos ninguém no caminho e acabei voltando para o lugar de onde eu acabara de vir, a fazenda do muro de pedra. O moço ficou confuso e por fim, chamou dois meninos que estavam sentadinhos lá e mandou eles me levarem até a "fazenda do Seu João". Andamos mais uns 20 minutos e chegamos até o lugar onde os carros estavam estacionados e onde havia um pessoal me esperando. Agradeci aos meninos quase chorando e dando-lhes beijos. Fui recebida com um abraço de um homem que eu só conhecia de vista do hotel.

Eu estava um trapo, imunda, toda machucada, chorando, sem falar coisa com coisa, Só dizia que tinha três filhos, que meu neném devia estar morrendo de fome e chorando, que meu marido iria querer o divórcio... Me trouxeram água, tentaram me acalmar, que iria acabar tudo bem. O marido de uma das moças se ofereceu para dirigir meu carro e eu aceitei. Fui conversando com ele no caminho, completamente alterada, faminta. Ele me escutou e foi muito gentil.

Chegando no hotel, eu estava morrendo de medo do que ainda estaria por vir. Mas encontrei João sentado, sem camisa, no banco, com Iuri no colo, olhando a paisagem e Gabriel comendo batata frita. João disse: "que irresponsabilidade, Mamá" em um tom quase brincalhão. E eu perguntei se Iuri havia chorado e ele disse que não. Disse que ele tinha dormido, depois acordado, soluçado bastante, feito cocô, dormido de novo e que acabara de acordar. Trêmula, dei um cheiro no Gabriel, peguei meu neném nos braços e ofereci o peito. Nina havia brincado na piscina e ajudado o pai a tomar conta do Biel quando ele precisou. Eram 13h30, duas horas depois do horário previsto.

Eu não conseguia acreditar que estava lá, que estava todo mundo bem... Então fui contando ao João aos poucos o que me havia acontecido. Nem eu mesma estava acreditando na minha história. Como assim, saí no mato sozinha? Que coisa mais idiota! Pra mim, esta pergunta tão profunda vai ficar sem resposta: o que fez com que eu, uma mulher e mãe tão responsável, entrasse em um mato totalmente desconhecido, sozinha, com grandes chances de me perder, me machucar, quiçá morrer, sem medir as consequências?

Não sei... Só sei que eu estava viva e presente naquele momento. Algo se passou dentro de mim para que eu me permitisse me perder, me entregar e finalmente me encontrar. E estou aqui! Fim. Fim?...